Tecnologia mRNA aplicada a uma bactéria letal
11/12/2023
Uma vacina de tecnologia mRNA criada pela primeira vez para uma bactéria letal
Embora o mundo tenha ficado a conhecer as vacinas de mRNA na pandemia de COVID-19, os primeiros ensaios clínicos com vacinas de mRNA em humanos datam de 2001, com um artigo de uma prestigiada revista a anunciar em 2018 uma “nova era na vacinologia”.
Num trabalho publicado na revista Science Advances, é apresentado o desenvolvimento de uma vacina de mRNA contra a Yersinia pestis, que causa a peste. Os testes realizados em modelo animal indicaram que a vacina é totalmente eficaz. Os autores sugerem que esta abordagem pode ser usada para criar vacinas para outros agentes patogénicos microbianos, inclusive aqueles que são resistentes a antibióticos.
Uma das vantagens das vacinas de mRNA é que elas podem ser desenvolvidas muito rapidamente em comparação com as vacinas tradicionais. Conforme observa um doas autores, apenas 63 dias separam o momento em que foi determinada a sequência genómica do SARS-CoV-2 e o primeiro ensaio clínico de uma vacina contra a COVID-19 baseada em tecnologia mRNA.
A peste é uma doença infecciosa causada pela bactéria Yersinia pestis, que fez milhões de vítimas ao longo da história da humanidade. Devido à sua letalidade e infecciosidade, a Y. pestis é classificada como arma biológica.
Os autores referem, contudo, que “até agora, acreditava-se que as vacinas de mRNA contra bactérias eram biologicamente inviáveis e que este estudo provou que é, de facto, possível desenvolver vacinas de mRNA 100% eficazes para bactérias letais”, tendo a vacinar mRNA-LNP desencadeado uma resposta humoral e celular em ratinhos C57BL/6 e conferido uma rápida e total protecção contra Y. pestis, após uma única dose.
Uma vacina de mRNA contra um vírus utiliza porções do genoma viral. Quando um vírus infecta uma célula hospedeira, assume o controlo da maquinaria da célula hospedeira para produzir proteínas virais e mais partículas virais; os vírus geralmente não conseguem fazer isso sozinhos. O mRNA de uma vacina e as proteínas virais correspondentes são muito semelhantes ao que é realmente usado e produzido nas células hospedeiras durante uma infecção.
Os autores referem que, embora se tenha tentado utilizar, em trabalhos anteriores, células humanas para produzir proteínas bacterianas, esta abordagem não tem sido capaz de desencadear a produção de anticorpos e não estimulou a protecção imunitária. Apesar das proteínas bacterianas serem basicamente as mesmas do que aquelas produzidas em laboratório, essas proteínas sofrem muitas modificações nas células humanas, como a adição de grupos de açúcar, quando são libertadas das células humanas.
Neste trabalho, os autores produziram proteínas bacterianas, contornando ao mesmo tempo as modificações que as proteínas bacterianas sofrem nas células humanas, como a adição de grupos de açúcar. Aumentaram a estabilidade das proteínas bacterianas para que não se degradassem rapidamente no corpo humano, adicionando uma porção de uma proteína humana.
O primeiro autor do estudo, E. Kon, conclui que “o resultado foi uma resposta imunológica significativa, com o sistema imune capaz de identificar as proteínas da vacina como proteínas bacterianas imunogénicas” e que “ao combinar as duas estratégias inovadoras, foi obtida uma resposta imunológica completa”.
A eficácia vacina em humanos ainda necessita de ser testada.
A pandemia de COVID-19 mostrou que as vacinas de mRNA nem sempre podem parar a infecção, e os modelos pré-clínicos da vacina de mRNA para COVID-19 também sugeriram que eram muito protectoras em animais contra a infecção por SARS-CoV-2.